20 fevereiro, 2006

Utilidade de viagem espacial causa polêmica

Alan Gripp e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. A euforia pela estréia de um brasileiro no espaço deu lugar à polêmica. Faltando pouco mais de um mês para o astronauta Marcos Cesar Pontes embarcar na nave russa Soyuz rumo à Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), cientistas discutem se a viagem, que custará entre US$ 10 milhões e US$ 15 milhões aos cofres públicos, é a melhor porta de entrada do país no espaço.

Há quem diga que o feito do tenente-coronel da Aeronáutica que desde menino sonhava em ir à Lua marca uma nova era no programa brasileiro e insere de vez o país nesse mercado. Mas há também especialistas que são taxativos: o Brasil só terá condições em entrar na briga quando gastar os parcos recursos para o setor em infra-estrutura de ponta e formação de mão-de-obra extremamente qualificada.

— Essa viagem é apenas turismo espacial, uma viagem de efeito. Pode chamar atenção, mas não tem significado científico — critica o físico Ennio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Candotti argumenta que as experiências que Pontes fará nos 11 dias em que estiver no espaço ou já foram feitas ou são irrelevantes. Na sua opinião, antes de mandar um astronauta ao espaço a prioridade do país seria desenvolver o primeiro satélite 100% brasileiro, que poderia, segundo ele, realizar trabalhos relevantes como pesquisas climáticas, monitorar fronteiras e o desmatamento da Amazônia:

— Estamos começando pela sobremesa. Com US$ 15 milhões, formaríamos dois mil especialistas.

Para José Monserrat Filho, jornalista especializado, os erros tiveram início em 1997, quando o governo brasileiro firmou um acordo de cooperação espacial de US$ 120 milhões com os EUA. O acordo previa uma significativa expansão do programa espacial, inclusive com a participação de um brasileiro numa missão. Mas, como o governo não investiu os recursos prometidos, o programa perdeu fôlego.

— A questão deveria ter sido discutida amplamente antes do acordo de 1997. Criamos um astronauta e, agora, o que faremos com ele? — afirma Monserrat.

Já o presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Gilberto Câmara, defende as experiências que serão realizadas por Marcos Pontes — entre elas, pesquisas com insetos em ambientes de gravidade zero. Presidente da Agência Espacial Brasileira (ABE) no governo Fernando Henrique, Múcio Dias, defende a missão.

— Não é turismo espacial. Essa decisão não foi tomada hoje, está num contexto de um processo de desenvolvimento do programa espacial. Por que abortar agora? — indaga.

Uma análise do orçamento para a área espacial mostra que a preparação de astronautas é prioridade para o governo. Em 2005, a formação teve R$ 11,9 milhões, contra R$ 7,6 milhões para a reconstrução da torre para o lançamento de foguetes — destruída no acidente com o veículo lançador de satélites, em 2003, em Alcântara — e R$ 5,6 milhões para participação em programas espaciais internacionais. A verba do treinamento representou pouco mais da metade do que foi enviado em 2005 para a infra-estrutura na base de Alcântara (R$ 21,5 milhões).

Alguns críticos da missão dizem ainda que ela tem mais efeito político do que científico. Quando estiver no espaço, Marcos Pontes fará um contato com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Fonte:
http://oglobo.globo.com/jornal/ciencia/191907239.asp

Comentário:

Uma das principais característica de quando se quer
quebrar o senso comum, principalmente sobre a ciência, é de usar o efeito da
estética, do clamor público para uma causa 'perdida', etc.

Eu me lembro sobre a história da construção do prédio
de pesquisa e produção de soros de animais peçonhentos, no atual Instituto
Carlos Chagas, no Rio de Janeiro. A população não aceitava a idéia de ser
submetida a vacinação. E além de brigar por verbas, o governo lutava contra a
opinião dos políticos insulflados pelo senso comum da opinião pública. Durante a
construção do prédio, ele teve que ser totalmente escondido da visão pública.
Além de sua arquitetura tendo sida totalmente feita de um jeito diferente para
uma instituição de pesquisa da época. Isto para que a sua própria beleza, fosse
o trunfo para que a população não o depredasse ou que as verbas não se
extinguissem. O texto que escrevo aqui, é uma lembrança do que li numa das
revistas da Ciência Hoje. Para uma pesquisa mais extensa e profunda, procure na
internet ou na própria revista. Em suma, a política e a estética salvaram a
ciência brasileira.



Fonte:
http://oglobo.globo.com/jornal/ciencia/191907239.asp

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