06 fevereiro, 2006

Para redes de televisão, só padrão japonês impede avanço das teles

05/02/2006 - 10h31
DANIEL CASTRO
Colunista da Folha de S.Paulo

Para as redes de TV, somente o padrão de modulação do sistema de TV digital japonês (o BST-COFDM) proporciona hoje as funcionalidades que lhes assegurarão sobrevivência nos próximos dez anos. Essa tecnologia lhes permitiria bloquear o acesso das teles e de novas emissoras ao espectro da TV digital, mantendo o "monopólio" do ar.

Um sistema de TV digital completo inclui o padrão de modulação (seu "coração"), o padrão de codificação (as redes querem o MPEG-4) e o "middleware" (algo como um Windows do sistema, que "roda" os aplicativos).

As TVs entregaram ao presidente Lula, no último dia 18, uma carta em que pedem a adoção do BST-COFDM, a possibilidade de elas transmitirem em alta definição (HDTV) e em definição standard (SDTV), com recepção simultaneamente em televisores fixos, móveis (em veículos) e portáteis (celulares) usando 6 MHz.

Segundo as TVs, só o padrão japonês permite isso --o que os outros sistemas negam. Assim, elas poderão transmitir para telefones celulares (desde que o aparelho seja de terceira geração e tenha um chip especial) sem passar pelo tráfego das operadoras de telefonia móvel. As teles, que querem gerar receitas com o tráfego de vídeo, obviamente são contra.

Para as emissoras, principalmente a Globo, o padrão americano não é interessante porque ele ainda não é robusto o suficiente. Testes da Universidade Mackenzie em São Paulo mostraram que o padrão, desenvolvido para um país quase todo cabeado, não funciona numa nação em que 93% da população só vê TV pelo sinal aberto, pelo ar. Os televisores não "pegariam" seu sinal.

Já o europeu também não interessa porque, apesar de permitir alta definição, foi desenvolvido e seria direcionado para um modelo em que as teles são dominantes.

Na Globo, o padrão japonês é visto como a única forma de assegurar um diferencial de qualidade para a TV aberta (a alta definição) e de impedir o avanço das teles.

Apesar de o sistema permitir a multiprogramação (quatro canais simultâneos), a idéia é transmitir o máximo em HDTV. A definição standard só seria usada em ocasiões especiais, como numa Olimpíada: a emissora se dividiria em dois canais quando o Brasil estivesse simultaneamente disputando uma medalha na natação e outra no vôlei, por exemplo. Dividir seus 6 MHz em quatro não interessa às redes: encarece custos (terão que produzir ou comprar mais conteúdo), pulveriza a audiência e não necessariamente atrai mais verba publicitária.

"A alta definição é a única chance de a TV aberta se manter competitiva", diz um alto executivo da rede. Na alta definição, a imagem é melhor do que a do DVD. Há uma sensação de profundidade muito maior. A funcionalidade, no entanto, encarece a produção, porque capta detalhes que a TV standard oculta, como fissuras em cenários. Devem-se gastar 25% a mais em produção.

No raciocínio da Globo, as teles querem forçar as TVs a serem clientes delas ou impedir seu avanço de qualidade, pela tecnologia ou pelo modelo econômico.

Para a Globo, se escolher o padrão americano, o Brasil criará uma "reserva de mercado" para as teles. Isso porque o modelo dos EUA ainda não permite transmitir para televisores fixos e celulares usando a faixa de 6 MHz das TVs. É necessário uma freqüência extra, a ser operada por uma tele.

Diz a Globo ainda que o padrão europeu já transmite para televisores e celulares, mas, quando isso ocorre, o sinal do aparelho fixo perde qualidade. Representantes do consórcio europeu negam. Além disso, as TVs abertas da Europa não têm alta definição, o que cria um filão para as teles distribuírem conteúdo em HDTV via internet de banda larga.

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u104948.shtml

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