28 novembro, 2005

Um mínimo de civilidade

24/11/2005
Aceite o desafio e responda: quantos gestos elegantes você teve durante o expediente de trabalho nas últimas 24 horas? Coisas como dar retorno a um e-mail ou telefonema, iniciar uma reunião no horário combinado, agradecer a companhia de quem o acompanhou num almoço ou, simplesmente, falar com a pessoa ao lado, em vez de enviar um e-mail. Antes de se recusar a responder ou emitir qualquer juízo de valor sobre tal desafio, saiba que ele foi feito por dois profissionais de larga experiência, currículos substanciosos e admirados no mundo corporativo, Roberto Teixeira da Costa e Susanna Sancovsky, que lançam o livro Nem só de Marketing... Postura e Comportamento no Mundo Corporativo. Não se trata de guia de auto-ajuda ou manual de etiqueta. São depoimentos, histórias saborosas e avaliações sobre regras de boa educação que levam as pessoas a refletir sobre como tornar qualquer relacionamento mais agradável. "Pretendemos fazer com que as pessoas pensem melhor sobre o que fazem em seu dia-a-dia, que explorem seu feeling", diz Teixeira da Costa, do conselho de administração de empresas como Sul América Seguros e Banco Itaú e vasta experiência em entidades internacionais. No final da leitura, conclui-se que um deslize de elegância num determinado gesto pode, sim, influenciar negativamente uma negociação. Quem não se recorda do caso em que o então ministro da Casa Civil, José Dirceu, deixou o deputado Fernando Gabeira irritadíssimo ao obrigá-lo a tomar um verdadeiro chá de cadeira de mais de noventa minutos, depois de convidá-lo para uma conversa sobre sua anunciada saída do PT? Gabeira acabou se retirando, antes que José Dirceu aparecesse para recebê-lo. E foi para o PV. "Um dos deslizes que mais me deixam irritada é exatamente a falta de pontualidade", afirma Susanna Sancovsky, consultora e experiente na organização de eventos, e que sabe o que é ter de rearranjar agenda em função de atrasos. "Deixar de olhar nos olhos dos outros em uma conversa é outra deselegância. Muitas vezes, um colega sentado ao lado do outro prefere enviar um recado via e-mail a olhar nos olhos da pessoa e simplesmente conversar!" Teixeira da Costa diz que são imperdoáveis a falta de resposta a um e-mail ou telefonema ou as desculpas esfarrapadas, que denotam desconsideração para com os outros. "Isso me irrita. As pessoas têm de ter um mínimo de civilidade", dispara ele. Exemplos não faltam. Brasileiro não sabe dizer não e por isso mesmo fica contornando uma situação para se livrar de alguém ou de algum compromisso, cria falsas expectativas, quando poderia ser claro. "Saber dizer não é uma arte que deve ser aprendida". O que também torna a leitura do livro interessante são as citações e casos relatados por empresários, políticos e jornalistas, que realmente fazem o leitor refletir sobre como se comporta no dia-a-dia. "É impossível o leitor deixar de se ver - e fazer o mea culpa, em pelo menos uma situação ilustrada no livro". Um dos entrevistados é o ministro Luiz Fernando Furlan, que diz sofrer não apenas com a falta de pontualidade. "Há uma tendência de o brasileiro ser mais crítico sobre o seu país do que o estrangeiro. Realçamos as coisas negativas". A diferença cultural entre países também ganha espaço via relatos que mostram desde o cuidado que se deve ter com pequenos gestos, como aperto de mão, até a escolha do intérprete ou da forma como conduzir uma negociação. "Se você assume uma postura errada em negociações, no Japão ou na China, pode queimar o filme para sempre". Também merece atenção a imagem do brasileiro lá fora. "Uma crítica é a da falta de preparação para reuniões. É preciso acabar com a idéia de que mais vale a capacidade de improvisar", dizem os autores.


Publicado originalmente no jornal Valor Econômico. Texto de Margareth Boarini.

Fonte:
http://www.revistadigital.com.br/ideias_numeros.asp?CodMateria=2980

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