22 novembro, 2005

Reunião discute dificuldades para a inovação no país

22/11/2005 - 09h37

RICARDO BONALUME NETO
Enviado especial da Folha de S.Paulo a Brasília

Foram três dias discutindo, supostamente "desenvolvendo idéias para desenvolver o Brasil". Mas o que se viu mais na 3ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, encerrada na última sexta, foi mais repetição do que "inovação". Tirando essa palavra da moda, parecia um "déjà vu" da primeira conferência, de 20 anos atrás. Com muitos dos mesmos participantes, agora de cabelos brancos e grisalhos."Vinte anos atrás o diagnóstico era precisamente o mesmo", diz Luciano Coutinho, economista da Unicamp que ajudou a organizar a primeira conferência, quando era secretário do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT)."Havia um processo, que se desarticulou. Hoje, o desafio é muito mais profundo e complexo." Coutinho diz acreditar que há condições para um novo ciclo de crescimento econômico. Certas vulnerabilidades, como a hiper-inflação, passaram. Mas, lamenta: "perdemos vários bondes".Tanto em 1985, quando foi criado o MCT, como hoje, as empresas brasileiras pouco investem em tecnologia. "Conseguir uma mudança na cultura no setor empresarial é um desafio", diz o ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende. Para ele, nos seus primeiros 15 anos de existência o ministério praticamente só se preocupou com a ciência e a formação de recursos humanos. Não havia ligação com política industrial, nem ações para incentivar a indústria a investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D)."É necessário ter políticas setoriais", diz Coutinho, que critica tanto os juros altos como os dólares baratos da política econômica atual. "Só em 2000 o MCT começa a falar em inovação", diz Rezende. Enquanto isso, outros países de renda média como a Coréia do Sul criavam mecanismos para obtenção de capital de risco, subvenções a P&D.Rezende agora comemora os novos instrumentos, finalmente produzidos, como a Lei de Inovação e sua regulamentação, e a MP do Bem, desonerando impostos. Ou o que deverá vir logo ou nem tanto --como as atrasadas leis de Biossegurança e Informática.O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu na abertura da conferência assinar nesta semana a regulamentação da Lei de Biossegurança.Presença empresarial"Estamos fazendo agora o que a Coréia fez nos anos 1980", declara Rezende, que diz que uma das grandes novidades na conferência é a maior presença do setor empresarial. Eles de fato estiveram presentes, para reclamar destes 20 anos de incúria.Foi o caso de Wolney Betiol, um dos diretores da Bematech, da qual se pode de fato dizer que é uma empresa inovadora, na área de automação comercial e bancária. "Há seis anos discutíamos a reforma tributária, com a carga tributária representando 28% do PIB. Foi para 38%, e continuamos discutindo a reforma", diz Betiol, também diretor na Anpei (Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras).Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), lembrou que já em 1916 o presidente dos laboratórios Bell, nos EUA, dizia que a pesquisa industrial apropriadamente dirigida e realizada com princípios científicos daria bom retorno às empresas.Brito Cruz lembra que faz mais de meio século que o Estado brasileiro investe em ciência. Bons exemplos na área tecnológica foram a urna eletrônica, a exploração de petróleo em águas profundas, a Embraer, o agronegócio da soja e da laranja, e agora os carros de combustíveis variados."Mas é algo que não se consegue fazer repetitivamente", diz o diretor da Fapesp, lembrando que instituições e empresas do Brasil em 2004 registraram 106 patentes nos EUA, contra 4.428 dos sul-coreanos. Em primeiro lugar está a Petrobras, em segundo a instituição dele, a Unicamp. Que uma universidade esteja na lista é um péssimo sinal. Pois um dos razoáveis e óbvios consensos na conferência é que inovação tecnológica se faz em empresas. "São as empresas que geram riquezas", diz.O jornalista Ricardo Bonalume Neto viajou a convite do MCT.

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u13984.shtml

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