22 março, 2006

Depois da farsa petista, a farsa tucana

ELIO GASPARI

uem acreditou no monopólio da ética pela nação petista fez papel de bobo e, com razão, zangou-se. Só falta agora que essas mesmas pessoas resolvam acreditar no monopólio da ética pelo tucanato. Em matéria de parolagem vem aí uma sucessão presidencial onde se encontrarão Geraldo Alckmin e seu “banho de ética” e Lula com sua megalomania: “Está para nascer alguém que venha discutir ética comigo.”

Tome-se um exemplo destes dias, quando se discute a palavra do caseiro Francenildo Costa, aquele que chama Antonio Palocci de mentiroso. Que opinião uma pessoa formará desse cidadão depois de ler o seguinte diálogo:

— No sábado, eu tô aí. (…)

— Taí, se esse dinheiro sair, você pega uma boa bolada. (…)

— Quanto o senhor tem? Seis, é?

— (…) Tenho não. Dá uns dois.

Pode formar a opinião que quiser, porque Francenildo não tem nada a ver com essa conversa. Ela reproduz um trecho da gravação de uma cabala do deputado federal Domiciano Cabral do PSDB-PB com o empresário Julião Medeiros, seu sogro. (A Paraíba é governada pelo tucano Cássio Cunha Lima.)

O diálogo, gravado pela Polícia Federal com autorização judicial e divulgado no sábado pelo repórter Felipe Patury, não mereceu um só comentário da casa de banhos do PSDB. Na tarde de ontem, passados quatro dias da revelação, a página que o partido mantem na Internet tinha 32 notícias. Vinte e seis se referiam às roubalheiras-companheiras. Nenhuma mencionava Domiciano Cabral. Nem para que ele se defendesse.

É a lógica do Barão de Araruna (Osmar Prado na novela das seis) — “Não se discute maracutaia da casa-grande na frente dos criados.”

O PSDB repete a empulhação petista. Proclama-se monopolista da ética, e manda ver. Quer colocar seu candidato no Planalto julgando-se beneficiado por um habeas-caixa concedido pelo Padre Eterno. Fez isso no ano passado, quando impôs à choldra a permanência do senador Eduardo Azeredo na presidência do partido. Ele fora o cabeça de uma coligação partidária que recebeu R$ 9 milhões das arcas valérias.

Pode-se admitir o argumento segundo o qual esse ervanário se referia à campanha de 1998. Pode-se até admitir que, com a candidatura de Alckmin, a conta deveria começar no zero. Pois bem: o doutor Domiciano Cabral está na jurisdição básica de Alckmin.

O PSDB quer derrubar Palocci (a quem dedicou interessada idolatria, ao tempo em que até o caseiro Nildo sabia de seus feitos valorosos). É uma idéia. Querem encurralar o governo, confrontando-o com a prepotência que cultiva. É uma ótima idéia. Desde que não toquem trombetas no proscênio para fazer acordos nas coxias. Noves fora a proteção dada a Palocci pelos grão-tucanos, o deputado João Paulo Cunha foi presenteado no Conselho de Ética com uma indulgência do deputado Bosco Costa (PSDB-SE). Nenhum tucano se mostrou surpreso, nem o partido noticiou o feito.

Uma coisa é lutar contra a corrupção, bem outra é manipular essa luta. Essa foi a principal bandalheira petista. O surto moralista dos tucanos é falso como os depoimentos dos comissários petistas nas CPIs.

Suas denúncias devem ser estimuladas, pois é preferível um PSDB denunciando Palocci do que seus senadores defendendo-o. O que não se deve é acreditar na animação desse baile de solteironas. Muito menos em “banho de ética”. A um banho desses é preferível lamber sabão.

ELIO GASPARI é jornalista.

Fonte:
http://oglobo.globo.com/jornal/colunas/gaspari.asp

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