02 dezembro, 2005

Filhos, a prova de fogo da educação democrática

1/12/2005
Dinah Feldman / Folha de São Paulo

O israelense Yaacov Hecht, 47, aprendeu a ler e a escrever aos 13 anos. Aos 16, saiu da escola porque concluiu que não fazia sentido ficar nela. Quando lhe perguntavam por que não ia à escola, dizia: "Por que os demais vão à escola?"

Em 1985, reuniu um grupo interessado no tema e, dois anos depois, fundou a primeira escola democrática de Israel. Pai de quatro meninos, é diretor do IDE (Instituto para a Educação Democrática), em Tel Aviv. Ajudou a formar 25 escolas democráticas e a democratizar muitas outras.
Por que você dedica a vida à educação?

Yaacov Hecht - Lido com educação porque tenho questões pendentes da minha infância. Quando criança, eu era o símbolo da estupidez porque não sabia ler e escrever. Quando entrei no colegial, me tornei uma espécie de criminoso: comecei a roubar provas para ser um bom estudante. Ao terminar o nono ano, eu era o melhor da classe porque chegava bem preparado para os exames, afinal, eu os trazia prontos. Ao mesmo tempo, eu era guia dos escoteiros e falava em idealismo. Em 1973, quando começou a Guerra de Yom Kipur, parte da população foi para o exército e a cidade ficou vazia. Nós, os jovens, fazíamos a cidade toda funcionar. Quando a guerra acabou, eu teria de voltar para a escola e roubar provas. Senti que não podia fazer isso.

Quais foram as dificuldades iniciais do processo?
Hecht - Construímos a primeira escola democrática na cidade de Hadera. Em 1995, um dia após o assassinato do premiê Yitzhak Rabin, o ministro da Educação me ligou: "Yaacov, deixe a escola de Hadera e venha trabalhar comigo". Criamos um conceito para todo o sistema educacional, mas o partido dele não foi reeleito. Então, fundamos o Instituto para a Educação Democrática e, em 2001, criamos a Faculdade de Educação Democrática em uma das maiores universidades de formação de professores. Umas 300 instituições queriam adotar a democratização, mas, quando a escola começava a mudar, a Secretaria de Educação ou a prefeitura paravam o processo questionando se tínhamos permissão. Por isso, decidimos começar o processo na administração da cidade para depois chegar ao ensino.

Como mudar a mentalidade dos dirigentes das escolas?
Hecht - Sempre tenho de rever o que está dentro de mim - dentro de mim estão meus pais, meu professor e eles falam o tempo todo dos conceitos antigos. É uma luta interna. Eu caminho por meio dos ensinamentos dos meus filhos e não baseado no que falo, penso e escrevo.

Por que a escola atual não é boa?
Hecht - A escola estimula a idéia de que ser bem-sucedido é entrar na universidade, mas a universidade não é o único objetivo. Que um aluno queira encontrar sua singularidade e desenvolvê-la na universidade é maravilhoso, mas outro querer ser cantor ou jardineiro também é maravilhoso. Se alguém é hábil para construir cadeiras, não pode ser visto como um fracassado porque não entrou na universidade. Fico orgulhoso em saber que a maioria dos alunos formados pela escola democrática foram bem-sucedidos ao investir no que acreditaram.

Autor: Dinah Feldman / Folha de São Paulo

Fonte:
http://www.revistadigital.com.br/caderno_especial.asp?CodMateria=2990

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