11 maio, 2006

Churrasco X Prato Feito

Festa de delegados em churrascaria cria polêmica


Carla Rocha e Ronaldo Braga


Banquete para os delegados, prato feito para os policiais. A luta de classes foi um prato cheio ontem para as reivindicações salariais da categoria durante a comemoração do aniversário da Polícia Civil. Enquanto no Barra Brasa os delegados degustavam um rodízio completo com camarões grelhados, sushis, tenros pedaços de cabrito e polvo na brasa, inspetores e investigadores almoçavam no Restaurante Popular da Central do Brasil, onde, por um real, podiam escolher entre “boi ralado”, a boa e velha carne moída, e carne de porco com macarrão.



— É o retrato de uma política salarial injusta. Eles tiveram um almoço milionário, mas nós tivemos que enfrentar uma hora e meia de fila para comer um PF (prato feito) no Restaurante Popular — criticou Fernando Bandeira, presidente do Sindicato dos Policiais Civis, que idealizou a manifestação contra a garfada nos salários dos policiais.



Preço salgado para adesão: R$ 100



Cerca de 150 policiais civis, muitos delegados, além de chefes de departamentos, pagaram R$ 100 para participar do evento na Churrascaria Barra Brasa, na Barra da Tijuca, para comemorar os 198 anos da Polícia Civil, conforme noticiou ontem Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO. O convite foi divulgado no boletim interno da corporação, mas, de acordo com o sindicato, a adesão dos policiais foi pequena por causa do preço salgado. A distribuição dos ingressos foi feita no 11 andar da Polícia Civil.



Preocupado em despolitizar a questão, já que se esperava no local a presença de delegados que serão candidatos nas próximas eleições, o chefe da Polícia Civil, Ricardo Hallak, explicou rapidamente que o evento tinha um caráter institucional:



— Isso não é um encontro de policiais civis pré-candidatos para as próximas eleições. Hoje (ontem) estamos comemorando o aniversário da instituição.





O almoço começou por volta das 12h e, até as 14h, alguns pré-candidatos como o ex-chefe da Polícia Civil Álvaro Lins e os delegados Paulo Souto, Fernando Moraes e João Carlos Ferreira não foram vistos na churrascaria. Da bancada dos candidatos, apareceu apenas Zaqueu Teixeira, ex-chefe de Polícia Civil.



Na porta do Barra Brasa, onde repórteres foram impedidos de entrar, uma delegada, sem se identificar, disse que só a cúpula da Polícia Civil compareceu.



— Outros policiais não vieram porque falta dinheiro — afirmou a delegada.



Atualmente, o salário médio de um inspetor, com vantagens como triênio, está em torno de R$ 1.200 líquidos. Já os delegados ganham de R$ 6 mil a mais de R$ 15 mil.



Presidente da Associação de Delegados da Polícia Civil (Adepol), o delegado Wladmir Reale foi ao almoço do Barra Brasa e criticou a atitude dos policiais:



— É ação política, não adianta tentar confrontar os delegados. A gente tem uma carreira jurídica como os promotores. Jogar esta questão do um real é criar fato político, é pirotecnia — disse, acrescentando que, apesar disso, acha justas as reivindicações dos policiais.



Outro delegado que esteve na churrascaria disse que o almoço “não teve nada demais”.



— Essa confraternização acontece há anos. Todo ano, os delegados e membros da cúpula fazem um almoço numa churrascaria. Por que este ano seria diferente? — perguntou, mas não quis informar seu nome.



Os dois eventos foram mais um capítulo na acirrada campanha salarial dos policiais. Em março, eles chegaram a fazer cinco dias de paralisações. Logo no início da greve de fome do ex-governador Anthony Garotinho, um grupo chegou a levar quentinhas para a porta do prédio do PMDB, na Avenida Almirante Barroso, no Centro, provocando um início de tumulto com os seguranças do partido. A principal reivindicação dos policiais é a perda da Gratificação Especial de Trabalho (Geat) em 2001, que teria provocado uma redução de 70% nos salários dos policiais civis. Apenas delegados, policiais militares e bombeiros tiveram a gratificação incorporada aos vencimentos.



Antes do almoço, houve um culto ecumênico no auditório da Academia de Polícia, às 10h.




Fonte:
http://oglobo.globo.com/jornal/rio/247132142.asp

Nenhum comentário: