10 abril, 2006

Juan Perón, o mestre da astúcia tucana

Em 2002, Lula encarnava a esperança e a estrela petista era um brilho só. Apesar disso, piscavam alguns indicadores alarmantes. Delúbio Soares, seu tesoureiro, passara pela presidência do Conselho do Fundo de Assistência ao Trabalhador e deixara más lembranças pela maneira como triturou, em 2001, a proposta de abertura de uma CPI para investigar mau uso de verbas do fundo. Quem já tinha feito campanha com Duda Mendonça horrorizou-se ao vê-lo reger o coral da caciquia petista num exercício de adoração do Nosso Guia. (A cena está no documentário “Entreatos”, de João Moreira Salles.) Mesmo na bancada petista houve quem se surpreendesse quando José Dirceu fez de Waldomiro Diniz seu subchefe para assuntos parlamentares na Casa Civil.

Waldomiro era irrelevante. Duda, uma figura folclórica e Delúbio, um desconhecido. (Raposas como Antonio Carlos Magalhães e Tasso Jereissati só ligaram seu nome às suas práticas no segundo semestre de 2003.) O PT Federal tinha a sensação de que podia fazer o que quisesse. Deu no que deu.



Agora está aí o candidato tucano Geraldo Alckmin oferecendo um “banho de ética”. (“Banho”, na sabedoria da malandragem, é a palavra que designa uma partilha trapaceada.) Sua maioria parlamentar na Assembléia barrou 69 pedidos de CPIs. Os tucanos juntaram seu complexo de superioridade à opção preferencial pela patranha que contamina os petistas. Pena, porque se ganharem a eleição, o que hoje é um banho, amanhã será outra CPI.


Aos fatos.

No dia 18 de março o repórter Felipe Patury revelou que uma investigação da Polícia Federal gravara uma conversa do deputado Domiciano Cabral (PSDB-PB) com seu sogro, o empresário Julião Medeiros. Discutiam o destino do pagamento de uma obra pública. De acordo com a transcrição de uma conversa lisamente gravada, disseram o seguinte:

Domiciano – No sábado, eu tô aí. O senhor me dê isso que estou para conversar com o ministro (Alfredo Nascimento, dos Transportes).

Julião – Taí, se esse dinheiro do DNER sair, você pega uma boa bolada para a campanha.

Domiciano – Quanto o senhor tem? Seis, é?

Julião – Do DNER, tenho não. Dá uns dois.

Diante de uma reclamação de que o PSDB fizera de conta que nada acontecera, o presidente em exercício do partido, Alberto Goldman informou que no dia 21 o alto-tucanato considerara “de extrema gravidade as denúncias contra o deputado” e representara à comissão de ética do partido, pedindo sua expulsão do ninho. Goldman fez isso no dia 22 e acrescentou: “Ao deputado Domiciano Cabral será dado o prazo de dez dias para apresentar a sua defesa”.

Passados 16 dias da carta de Goldman, cadê o caso? Os tais dez dias eram delírio. O deputado teria esse prazo a partir do instante em que recebesse uma notificação mandada pelo relator do seu processo.


Cadê o relator? É o ex-ministro José Gregori, mas só foi designado no dia 28. Cadê a notificação? Até quinta-feira, não existia. O problema não está na demora. Está no papel de paspalho que fez quem acreditou na conversa tucana.

O PSDB pretende voltar ao governo. Pode até ser bom que volte, mas deve-se vigiar o tipo de blindagem com que se apresenta. O líder do partido na Câmara, deputado Jutahy Magalhães, já ensinou que “se é para punir caixa dois, tem que punir todo mundo”. (E por que não?)

O candidato Alckmin oferece um banho de ética à choldra e a presenteia com a seguinte pérola de sabedoria histórica: “Fale muito das coisas, pouco das pessoas e nada de você”.

Beleza. Ele explicou que o conselho vem de Juan Perón, um coronel ladravaz, demagogo e liberticida que governou a Argentina duas vezes (1946-1955 e 1973-1974). Arruinou-a. A pupila era sua segunda mulher, Maria Estela (Isabelita) Martinez, uma dançarina de cabaré panamenho que acabou presidindo o colapso do regime civil de seu país. Entregou o governo a um bruxo maluco, assassino e ladrão, foi deposta em 1976 e está por aí, sem ter que trabalhar para viver. Aprender política com um governante que poderia ter fundado a Opus Lucifer pode resultar em banho de qualquer coisa, menos de ética.



Lembo não entendeu o Bolsa Roupa



O governador de São Paulo, Claudio Lembo, como Tancredo Neves, veste-se com a frugalidade dos anacoretas. Deveria evitar a consultoria fashion. Defendendo o guarda-roupa boca-livre de Lu Alckmin, disse que ele serve para “divulgar a moda brasileira, o estilo brasileiro e a mulher brasileira.” Discutí-lo, seria “uma grande tolice.”



Num mês, Madame Alckmin veste mais griffes estrangeiras que Elisabeth de Windsor, Laura Bush e Bernardette Chirac em um ano. Seu Valentino vermelho é inesquecível. Nesse aspecto, Lu Alckmin divulga a moda estrangeira. Indo-se ao seu cabideiro de peças da griffe nativa de Rogério Figueiredo, Lembo deveria ter lido a entrevista que o estilista deu à repórter Monica Bergamo. Está lá: “Tudo de dona Lu sempre foi importado. Nada é nacional.” O Bolsa Roupa é um estímulo à indústria têxtil de ultramar.



Fica uma dúvida. Quantas peças teve o mimo? “Poucas” (segundo a assessoria da senhora), “quarenta” (segundo ela própria) ou “quatrocentas” segundo Rogério Figueiredo? Para o pessoal do Bolsa Família, um trapinho desses sai por R$ 1 mil,. pelo menos.

Fonte:

http://oglobo.globo.com/jornal/colunas/gaspari.asp

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